quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Torta de Banana em Jericoacoara


O perfume doce e marcante da banana que vinha lá de dentro era delicioso. Selena ficou ali, do lado de fora da casa, com a cabeça enfiada na janela, quase se jogando dentro do salão daquela casinha branca de janelas marrons, em uma das quatro ruas de Jericoacoara. O que lhe chamara a atenção, fora mesmo o aroma que vinha de lá.

A princípio era apenas um cheiro gostoso e adocicado que tomava conta de toda a rua. Mas quanto mais se aproximou, os perfumes iam se apresentando um após o outro, e instigando o paladar de Selena. Conseguiu detectar o familiar aroma de banana, mas havia algo mais: o aroma era doce, amanteigado, tinha um leve toque de canela. Sim, tinha canela.
Quando não se aguentou mais bateu palmas desesperadamente pela janela e ficou a espera de alguém que pudesse lhe esclarecer o que exalava um perfume tão saboroso. Logo apareceu uma mocinha: magrinha, pequenina, loira e bem feita de corpo que com seus olhos bem verdes assustou-se ao ver Selena sentada no beiral da janela com as pernas já dentro do salão.

Pois não? - perguntou a moça, educadamente.
Bom dia! - disse Selena sorrindo. - Esse cheiro delicioso que me trouxe da rua até aqui é de que?
Ah, o cheiro de banana? É da torta.
Torta é? Hummmm e é pra vender?
É. Mas estamos fechados no momento. Essa é encomenda.
Sei. Mas você não pode me vender essa torta e fazer a outra da encomenda?
Na verdade não, porque se o cliente chegar e a torta dele não estiver pronta, é ruim pra gente.

Selena não queria saber, precisava comer daquela torta. O cheiro de banana já havia entranhado por todo o seu ser e ela já podia sentir o sabor mesmo antes de experimentar. Então arriscou:

Será que você não teria pelo menos um pedaço para me vender? Para eu experimentar? É porque esse cheiro está deliciosamente gostoso e eu realmente gostaria de provar essa iaguaria.

A menina sabia com o que estava lidando. Não raro pessoas paravam à janela para perguntar o que era aquilo que cheirava divinamente bem ou se não havia torta para vender e sempre lhes informava o horário de funcionamento e, com muito jeito, pedia que voltassem mais tarde quando poderiam ser servidos da melhor maneira possível. Mas daquela vez, não sabia bem o porquê, simpatizou com aquela mulher sentada na janela e lhe serviu um pedaço que havia guardado para uma amiga que viria lhe visitar mais tarde.

Ao dar a primeira mordida no pedaço de torta, Selena teve a sensação de estar flutuando. O sabor da banana bem doce, polvilhada com canela e acentuada com o sabor da manteiga que não sabia bem se vinha da massa ou da própria banana era perfeito. E aquela massa macia que desmanchava na boca fazendo suas pupilas gustativas entrarem em festa: Uau! Que torta maravilhosa! Menina, que horas mesmo você me disse que a loja abre? Tenho que trazer meus amigos aqui.

Desmanchando-se em agradecimentos e perguntas, Selena não parava de falar. E a menina, olhando-a fixamente não entendia bem porque as pessoas sempre reagiam daquela maneira. A torta era a coisa mais simples que ela já havia feito em toda a sua vida, chegava mesmo a ser bestinha, mas todo mundo se maravilhava com o resultado. Ficou pensando nos ingredientes e enumerando o passo a passo mentalmente para ver se descobria o motivo:

100grs manteira em temperatura ambiente
1 ovo grande
1 xícara de açúcar;
1 colher de sopa de fermento;
2 xícaras de farinha de trigo;
bananas cortadas em fatias ao longo do comprimento e canela a gosto.
Formar uma massa com as mãos até ficar homogênea, forrar uma assadeira (não precisa untar), dispor as bananas colocar açúcar e canela, levar ao forno.

Não... não tinha nada de mais nessa receita. Era simples. Fácil. Com ingredientes comuns, do dia a dia. A diferença era que antes de colocarem as bananas sobre a torta, elas passavam as bananas na frigideira com um pouquinho de manteiga. Sem deixar fritar, só dourar um pouco, para acentuar o sabor da banana. Depois polvilhavam canela sobre as bananas e levavam a torta ao forno pré-aquecido em 200º por aproximadamente 30 minutos ou até o palito sair limpo. Só se essa passadinha da banana na manteiga fosse o segredo.

Realmente, era muito besta aquela receita. Então, Marilene lembrou-se de quantas tortas ainda tinha que fazer, quanto trabalho ainda tinha pela frente e do horário que avançava nada lentamente e deixou os pensamentos de lado e despachando Selena gentilmente, retomou os ingredientes, colocou na bacia e pôs-se a amassar. Dali a pouco, os clientes começariam a chegar, mais encomendas a entregar e a loucura tornaria a se instalar! 

domingo, 11 de dezembro de 2011

Risoto de Abóbora com Gorgonzola


A infância difícil fez com que Diana se determinasse a ter uma vida digna quando adulta. Quando criança por vezes passara fome e tivera de dividir a comida com os irmãos, mesmo sentindo fome. A comida não era suficiente para toda a família. O pai abandonara-os quando os gêmeos eram ainda bebês e toda a carga da família ficara com sua mãe.

A doce Anália! Logo que engravidara dos gêmeos, Teobaldo suplicara para que ela deixasse o emprego para ser mãe em tempo integral. Graças a Deus, Anália amava demais o que fazia para escutar o marido. Continuou trabalhando duro. Viviam uma vida difícil porque tanto Anália quanto Teobaldo ganhavam pouco, e com três crianças tinham muita coisa para pagar. Quando ele sumiu de casa, Anália pensou que não daria conta. Conseguiu, até onde a vida a permitiu, criou três belos filhos.  Mas a vida não estava disposta a ser benevolente com Anália, levou-a cedo. Quando os gêmeos estavam com 15 anos, Anália teve uma doença grave e foi-se. E toda a carga ficou com Diana, com 21 anos então.

Diana, que trabalhava de ajudante de cozinha numa cantina italiana, mudou-se para mais perto da escola dos meninos e resolveu que iria fazer faculdade de gastronomia. Começou a trabalhar dobrado na cantina para acumular não só conhecimento, como também o dinheiro necessário para sustentar seus irmãos e pagar a faculdade. Conseguiu uma bolsa numa boa faculdade bem longe de casa. Tinha que pegar um ônibus e o metrô e ainda carona com uma colega da estação até a faculdade. Chegava em casa depois da meia noite e acordava às 5 da manhã. Em nenhum momento, esmoreceu pois. A cada dia, quanto maior a dificuldade, maior a determinação de Diana.

Até que chegou o grande dia e Diana formou-se. Os gêmeos estavam lá, sentados na primeira fila de convidados, aplaudindo e assobiando para a irmã. Como se amavam aqueles três! Aquela era uma conquista de toda a família. Por Anália! Até seu Giuseppe, o dono da cantina onde ela trabalhava, estava lá, com seus colegas de trabalho. Com lágrimas nos olhos, Diana recebeu o diploma, o ergueu aos céus e agradeceu a Deus.

Todos haviam sido convidados para comemorar na cantina do seu Giuseppe, mas Diana seria a chef daquele momento. Ela havia pensado numa receita super especial: Risoto de abóbora com gorgonzola.

Para duas pessoas a receita levava:
250g de arroz arbóreo
250g de abóbora em cubos, cozida
1 colher de sopa de azeite
1 colher de sopa de manteiga
1 cálice de vinho branco
100g de queijo gorgonzola
abóbora em cubos, frita para decorar
Caldo de frango
Alecrim

Porém Diana teve que aumentar a quantidade de ingredientes devido ao número de pessoas presentes. E começou a fazer:

Colocou o azeite e a cebola na panela até dourar. Juntou o alecrim e mexeu mais, até exalar seu perfume. Acrescentou o arroz (sem lavar) e mexeu até que ele ficasse transparente por fora e branco por dentro. Nesse momento adicionou o vinho até evaporar o álcool. A partir de então começou a colocar o caldo de frango concha por concha, sem deixar o arroz secar por aproximadamente 15 minutos. Nesse ponto acrescentou a abóbora cozida e o gorgonzola. Misturou. Acrescentou a manteiga e mexeu para dar cremosidade.
Serviu o risoto decorado com cubinhos de abóbora fritos e de gorgonzola, azeite e pimenta do reino moída na hora.

Os gêmeos sempre foram fãs da comida feita por Diana. Comiam e repetiam desde crianças. Naquele dia, parecia que estava tudo muito mais saboroso. Achavam que a conquista, o diploma e o amor tinham temperado melhor aquela comida. E aplaudiram a irmã de pé. Seguidos pelos outros convidados, que também aprovaram aquela combinação de sabores.

A suavidade da abóbora foi acentuada pelo sabor marcante do queijo gorgonzola, e a textura daquele risoto era extremamente macia. Ao chegar à boca, a mistura dos dois sabores era notável e sutil ao mesmo tempo. Uma refeição leve e inesquecível, digna de comemoração de momentos especiais!  

Quando os colegas estavam retirando os pratos, para servir a sobremesa, também criada e preparada por Diana, seu Giuseppe fez um convite: Diana, tu sei una buoníssima chef. E Carlo non trabalha mais na cantina. Quer ser a nova chef da Cantina Giuseppe? Che me dice tu?

Era muita emoção para um só dia! Com lágrimas nos olhos Diana foi abraçada pelos gêmeos que a ergueram nos ombros enquanto todos aplaudiam. Seu Giuseppe era só sorrisos e Diana, bem Diana sabia que aquele era apenas o começo de uma estrada de muito sucesso. A miséria e as dificuldades estavam sendo postas para trás, numa estrada trilhada rumo a uma vida melhor. Uma vida bem melhor.